domingo, 18 de janeiro de 2009

sofá vazio...


-São como magnetos.
-Perdão?
-Os bares.São como magnetos.
-Sim,de frustrados.
-Mulheres bonitas,frustradas e bêbedas.A minha especialidade.
Ela sorri,ele sorri com um tímido olhar rasgado pela conquista e as chaves caem a seus pés.
-Oh,não deixes que a morte te apanhe.Eu dou-te boleia.
-Quem te disse que queria boleia?-Sorri.-Eu vou para baixo.Agarra-me antes que parta o nariz e te suje o carro de sangue.
E ele agarrou.Trancadas as duas portas,o carro turquesa serpenteou pela estrada ladeada de árvores que se debruçavam para que lá de cima ninguém visse as particularidades do homem.E enquanto agitadas pelo temor do silêncio opressivo que se sumia por entre elas,precipitando-se em direcção àquele carro turquesa...
-Porque paraste?
-Quando tinha quatro anos tive este sonho.Estava numa sala branca e desenroscava lentamente uma garrafa de polpa de tomate,com um largo sorriso nos lábios,a olhar para uma grande lâmpada que pendia do tecto.Quando dou por mim estava tudo escuro e ouço um gemido profundo vindo de longe.A luz acende-se e vejo a polpa espalhada pelo chão.Um crescendo de gritos de reprovação estremecia à minha volta e eu,com lágrimas a cair do rosto,tentava limpar a polpa mas ela não saia de maneira nenhuma.Quanto mais limpava,mais polpa havia espalhada pelo chão.Nas minhas mãos.Na minha roupa.A misturar-se no meu sangue,a ferver dentro de mim.É quando os gritos param e ouço alguém caminhar na minha direcção.Os meus olhos presos nos olhos apaziguadores daquela mulher...volto a olhar para baixo...desaparecera tudo,a polpa desaparecera e a paz regressou àquela sala,fresca,branca como nunca deveria ter deixado de o ser.Aquela mulher tinha um queixo,assim,como o teu.Lindo.
Vês aquela luz vermelha,pulsante?É a minha cabana.
-Vives numa cabana?
-Não,é onde tenho o meu sofá vermelho.O meu covil do pecado.
Ela sorri com um travo de desilusão.
-És casado.
-Prestes a divorciar-me.
O seu olhar ilumina-se.Da-lhe a mão e titubeante mas decidida puxa-o na direcção da tal cabana,que o seu pensamento tratou logo de encher de sonho e esperança.

domingo, 11 de janeiro de 2009

maternidade...


-Lembras-te da ultima vez que viste a tua mãe?
-Não.
-Que idade tinhas quando viste pela ultima vez a Manuela Paredes?
-4.
-Queres falar sobre isso?
-Não.
-Não?Deixa que te diga uma coisa...rapaz,ou prestas "alguma" colaboração Aqui,Agora,para que eu possa voltar para casa,para a minha família,PARA A MERDA DE VIDA DE PLÁSTICO QUE ME FAZ PARECER BEM,aqui...ou tu colaboras ou estás fodido,tu sabes do que falo por isso vou perguntar outra vez com mais calma.Queres falar sobre A MERDA DO ASSUNTO CARALHO?
-Ela...ela estava sentada em cima de uma poça de vómito.Com as pernas cruzadas como...como se estivesse a meditar.
-Ela era uma puta de uma drogada,conta-me algo que eu não saiba...Oh não chores,tu sabe-lo bem.Pronto,desculpa,desculpa...não o devia ter mencionado.Podemos continuar com isto?
-Ela chamou-me.Eu não me quis aproximar.Ela insistiu,ela olhou-me nos olhos e insistiu.Ela nunca fazia isso.
-Nunca insistia contigo?
-Nunca me olhava nos olhos,não como se eu estivesse realmente lá,entende?
-Hum,continua.
-Pegou no Nancy e...
-Nancy?
-O cão.Agarrou-o e fez-me sinal com o dedo."Vem,vem."Eu aproximei-me.Aí,e sempre a olhar-me nos olhos,começou a apertar a garganta do Nancy e mandou-me olhar.Eu disse que não,não...mas ela enterrou os dedos no meu cabelo e fez-me ver aquilo.
-Disse-te algo?
-Disse-me:-Vês?Sentes a brisa na cara?A vida a abandonar esta pobre criatura indefesa?Agora entendes o quão simples é perde-la?Puff...já está.Escuta bem.Podes ser uma merda e ter dado cabo da minha vida,mas és a única merda que tenho.Mantém-te vivo,sim?
-E mais?
-Nada.
-Nada?Não te disse para onde ia?Nada?Apanhou um taxi?Boleia?
-Não sei,fui para o quarto e nunca mais a vi.
-Ok,acabamos por aqui.Levem este puto daqui,TIREM-NO DAQUI.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

ABJECÇÃO


Foi como um movimento solitário,perdido no arquear circense de rosto de homem.
Imbuído pelo cheiro do silêncio,corre sem fim,como um cobarde,um silêncio de cetim.
Empalidecem porque riem,tumbas jazem sobre as suas cabeças perpétuas,musgo brota dos seus ouvidos,lábios gastos,esgares nervosos,fatos de fazenda brancos,jardins sumptuosos.
Onde está a tua hipocrisia quando tanto me faz falta?